domingo, 20 de fevereiro de 2011

O fim da reprovação

- O Estado de S.Paulo
Depois de intenso debate travado entre 2009 e 2010, inclusive com a realização de audiências públicas em São Paulo, Salvador e Distrito Federal, o Conselho Nacional de Educação tomou a decisão de recomendar "fortemente" a todas escolas públicas, privadas e confessionais a substituição do sistema seriado - que permite a reprovação em todas as séries do ensino fundamental - por um "ciclo de alfabetização e letramento", em que os alunos são submetidos ao regime de progressão continuada, durante os três primeiros anos - ou seja, no período em que aprendem a ler e a escrever.
Para o CNE, o princípio da continuidade - especialmente na fase de alfabetização - traz mais benefícios para os alunos do que a chamada "cultura da reprovação". A medida, que não tem caráter de lei e é objeto de acirrada polêmica entre os pedagogos, foi homologada no final do governo Lula pelo ministro da Educação, Fernando Haddad. Com isso, os diretores de todas as escolas do País ganharam liberdade para decidir se continuarão reprovando alunos nos três primeiros anos do ensino fundamental ou se adotarão a recomendação do CNE.
O ensino fundamental tem 31 milhões de alunos estudando em 152 mil escolas, segundo o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep). Desse total, aproximadamente dez milhões estão matriculados nos três primeiros anos desse ciclo. Em 2009, a taxa de reprovação desses dez milhões de alunos foi de 5,1%. O índice é considerado alto pelos especialistas em pedagogia.
"Isso mostra que, de cada cem crianças, cinco ainda são reprovadas logo que ingressam na escola. As pesquisas apontam que, se o aluno é reprovado nessa fase, dificilmente terá sucesso. A recomendação do CNE é para garantir que todas as crianças estejam alfabetizadas até os oito anos" - diz a secretária de Educação Básica do MEC, Maria do Pilar Lacerda. "A reprovação no ensino fundamental devia ser zero", afirma o professor da USP Ocimar Alavarsi, que coordenou a rede municipal de São Paulo, entre 1995 e 2008.
Vários professores também entendem que, na faixa etária dos 6 aos 8 anos, as crianças têm ritmos diferentes de aprendizagem e que reprovação logo no início do curso compromete o rendimento da alfabetização - o que desestimula as crianças, levando-as a abandonar a escola. No Norte e Nordeste, as regiões mais pobres do País, as altas taxas de evasão escolar têm sido atribuídas aos altos índices de reprovação nos anos iniciais do ensino básico. Segundo os defensores das diretrizes recomendadas pelo CNE, com a adoção do regime de progressão continuada nas três primeiras séries os professores podem avaliar cada criança e os alunos só podem ser reprovados no final do terceiro ano.
Para os críticos dessa política, a substituição da reprovação pelo regime da progressão continuada seria uma estratégia eficaz se as classes fossem pequenas, se os professores estivessem motivados e as escolas contassem com projetos pedagógicos realistas. "Na prática, porém, as escolas têm salas superlotadas, as aulas de reforço são dadas por voluntários, os professores têm pouquíssimo tempo para planejar aulas e as condições de trabalho são ruins. A sensação é que a proposta (do CNE) não foi feita por quem conhece o dia a dia das escolas" - diz Susana Gutierrez, coordenadora do Sindicato Estadual de Profissionais da Educação do Rio de Janeiro. Sem reformar o currículo e investir nos professores, "as crianças que não aprendem com o sistema seriado também não aprenderão no Ciclo de Alfabetização e Letramento", afirma Cláudia Fernandes, coordenadora do mestrado em educação da UniRio.
Aperfeiçoar o ensino fundamental é decisivo para que o país possa promover a revolução educacional. No entanto, a simples adoção da progressão continuada, nos termos em que foi proposta pelo CNE e pelo MEC - sem expansão da rede escolar e sem a modernização dos currículos - não garante melhor alfabetização nem aumento da qualidade da educação.







Conselho quer fim da reprovação de crianças até 8 anos

AE - Agência Estado
Novas diretrizes curriculares aprovadas pelo Conselho Nacional da Educação (CNE) e homologadas pelo Ministério da Educação (MEC) recomendam que os três primeiros anos do ensino fundamental, que abrangem crianças de 6 a 8 anos, sejam feitos em um ciclo, sem reprovação. As regras foram publicadas em 14 de dezembro de 2010 no Diário Oficial.
Discutida ao longo dos últimos anos, a proposta já é colocada em prática por algumas cidades e Estados, como Minas Gerais e São Paulo. "Estudos mostram que essa iniciativa pode trazer ótimos resultados", afirma a secretária de Educação Básica do MEC, Maria do Pilar Lacerda. O principal deles seria evitar que crianças que apresentam um baixo desempenho no primeiro ano se sintam desestimuladas. "A experiência mostra que as maiores taxas de abandono escolar ocorrem entre alunos que repetiram nos primeiros anos de escola", completa.
Para críticos da proposta, a medida seria uma forma de mascarar o problema de má qualidade de ensino. O relator do processo no CNE, o conselheiro Cesar Callegari, diz que o propósito da medida é proteger o estudante. "A todas as crianças é dado o direito de estar alfabetizada aos 8 anos. Muitos alunos apresentam diferenças no ritmo do aprendizado, mas, até o 3.º ano, todos têm condições de ler e escrever", diz.
Em uma escola de qualidade ruim, o problema poderia ser revelado antes do terceiro ano. "Não é para o aluno ficar solto. A ideia é que seja feita uma série de avaliações. Qualquer problema no desenvolvimento do aluno poderia ser captado", afirma Callegari. De acordo com o conselheiro, o MEC está definindo quais são as expectativas de aprendizagem para cada etapa, para que em cada ciclo o aluno seja acompanhado.
"As avaliações deverão ser feitas sobretudo em procedimentos de observação, registros de atividades", diz Maria do Pilar. A secretária de Educação Básica argumenta ainda que a avaliação da escola não é feita por meio dos índices de repetência.
As escolas têm autonomia para adotar ou não as diretrizes publicadas hoje. Maria do Pilar salienta que mesmo as escolas que preferirem manter o regime seriado serão recomendadas a manter os três anos num bloco pedagógico. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.







João Havelange

 
Fabio Motta/AE

Bruno Lousada - O Estado de S.Paulo
Presidente de honra da Fifa e membro do Comitê Olímpico Internacional (COI) desde 1963, João Havelange, de 94 anos, admitiu ao Estado que vai tentar uma manobra para manter o presidente do COB, Carlos Arthur Nuzman, na Assembleia Geral do COI, que tem 108 membros. Nuzman está com 68 anos e a idade limite é de 70. Havelange pretende prorrogar a permanência de qualquer dirigente no COI até os 78 anos. Assim, Nuzman teria acesso livre no comitê internacional até os Jogos Olímpicos do Rio, em 2016.
Fabio Motta/AEEx-presidente da Fifa, João Havelange reconheceu que o Brasil ainda precisa de muito para virar potência olímpica
"Ele sendo da Assembleia, tendo os Jogos Olímpicos aqui, é importantíssimo", disse Havelange, em seu escritório, no centro do Rio. Na quarta-feira, num evento em Ipanema, zona sul da cidade, será lançado o livro João Havelange - O dirigente esportivo do século XX, pelo selo COB/Cultural. "Foi uma surpresa e uma gentileza do Nuzman", admitiu.
Como recebe a homenagem?
Eu faltaria com a verdade se dissesse que sabia que o livro estava sendo feito. Foi uma surpresa e uma gentileza, um sentimento de amizade do Nuzman comigo. Porque foi ele que mandou preparar. Portanto, sou gratíssimo a ele. Em segundo, rever o passado, principalmente meus pais, meus irmãos, enfim, a minha juventude no Fluminense, foi uma felicidade. O livro me trouxe belas recordações.
O senhor alcançou muito poder e prestígio no esporte. Ainda sonha em realizar algo?
Há um sonho que gostaria de realizar e não consegui porque meu mandato terminou. Era fazer um jogo de futebol das seleções de Israel contra a Palestina. Minha vontade é fazer o jogo em Nova York, onde está a ONU e convidar todos os chefes de estado. Na preliminar, a seleção brasileira enfrentaria os Estados Unidos. Outro desejo é fazer um jogo em Seul e outro em Pohang entre o combinado da Coreia do Sul e Coreia do Norte contra o Brasil.
Como vê o trabalho atual do Brasil para sediar o Mundial de 2014? Não deveríamos ser mais rápidos?
Eu não devo me meter nisso, mas, o senhor me perdoe, a Fifa só faz (a Copa) depois de ter entendimento com o governo. O governo é quem tem de fazer a segurança, rever os aeroportos e verificar os estádios. A CBF entra com sua equipe e sua organização. Pergunto: mexeram nos aeroportos? Não. Mexeram nas estradas? Não.
A construção de estádios não está mais lenta do que o normal?
Eu acho que sim, mas o que posso fazer? O governo é quem tem de fazer, o senhor me perdoe, porque estamos em 2011 e a Copa será em 2014. Sei que, atualmente, a parte técnica de uma construção é muito valiosa e rápida. Mas tem um limite também. Não é verdade? Certa vez, disse que o Maracanã deveria ser implodido e fui muito maltratado.
O senhor continua a favor de um outro estádio no Rio?
Não faria ali. Se quiser aumentar para um lado, tem a estrada de ferro. Não pode. Do outro lado, passa um rio. Não pode. Se quiser ir para trás, não pode. Tem uma universidade. O Rio deve ter outro lugar com melhor acesso.
Não há uma preocupação de os estádios da Copa e as instalações da Olimpíada virarem elefantes brancos?
O governo é que tem de ficar preocupado e oferecer ajuda. Por que nos outros países funciona? O que temos de fazer é a nossa gente mudar a mentalidade. Em vez de criticar, usar e dizer que é bom.
Não faltam políticas públicas para estimular o esporte no País?
Quando os EUA montam a sua delegação e partem para os Jogos Olímpicos, o governo já investiu muito dinheiro para a preparação da equipe, enfim para tudo. Se o senhor falar nisso aqui, vai ser uma loucura. Gastar dinheiro é uma necessidade. Para isso, a gente paga imposto, é para reaplicar na massa. Olimpíada e Copa são para a massa.
O Brasil ainda tem muito a caminhar para virar uma potência olímpica?
Evidentemente. Não é fácil. Eu posso dizer que o Brasil está encantado com o Nuzman. O que esse moço trabalha para isso.
A pressão por vitórias na Copa e na Olimpíada vai ser enorme.
Nós só pensamos nisso. Não pensamos no espetáculo. Devemos pensar no espetáculo, no bem que é para a nação. Mas se não ganhar... Isso faz parte do nosso sentimento.
O estouro no orçamento do Pan-Americano de 2007 pode ocorrer novamente na Olimpíada?
Não é isso, meu filho. Vamos esquecer o Pan. O que passou, passou. O dinheiro gasto foi bem gasto.
Mas houve estouro.
Está bem. Houve um erro. Vamos esquecer e recomeçar de maneira diferente.
Muitos equipamentos do Pan caíram em desuso depois dos Jogos e nem sequer foram utilizados regularmente por crianças e adolescentes.
Quem é o culpado? A municipalidade e o Estado. Essa é a verdade. Isso pertence a eles. O governo é que deveria fazer (esse trabalho), assim como a Secretaria de Esporte do município e do Estado. Se tem uma mocidade, por que não oferecer a ela? Está lá para ser utilizado.
O senhor acha que, a médio ou longo prazo, o Brasil terá outro representante no comando da Fifa? Acredita que Ricardo Teixeira está apto a seguir seus passos?
Está apto. É culto, correto e dedicado. Na Fifa, ele é muito apreciado e o futebol do Brasil tem se apresentado com dignidade e valor. O (atual presidente da Fifa, Joseph) Blatter vai ser reeleito em 2011, mas em 2015, se Deus quiser, vai ser o Ricardo. Se eu tiver vivo e com forças, vou ajudá-lo..
O senhor é a favor de renovação de poder no esporte, tanto no COB quanto na CBF?
Renova. Recomeça tudo do zero. O Ricardo (Teixeira) conhece todo mundo na Fifa. Bota um lá. Vai feito bobo. Se puder, ele vai preparando um (substituto). No Comitê Olímpico Internacional (COI), quando (o dirigente) faz 70 anos, tem de sair, porque é a idade-limite. Vou conversar com ele (Jacques Rogge, presidente do COI), e viajarei para o COI, na Suíça, em maio. Em julho, tem assembleia em Durban, na África do Sul. Se eu não passar para 78 (a idade-limite), daqui a dois anos o Nuzman faz 70 e ele é membro da Assembleia Geral. Se o Rogge permitir essa mudança, o Nuzman ganha 10 anos lá. É uma necessidade para o Brasil. Ele sendo da Assembleia, tendo os Jogos Olímpicos aqui, é importantíssimo.
Por quê?
Eu tenho vários defeitos, mas não sou tão burro como você imagina. São 108 membros na assembleia, entre eles 58 são europeus. Quem é que ganha? Para eu ganhar alguma coisa, o que devo ter feito? Habilidade, gentilezas e contatos. Nessa reunião, eu trabalho com meus amigos para passar (mudar o estatuto). Porque ali você toca na sensibilidade de cada um. Por que aqueles que vão sair, se puderem ficar mais oito anos, você acha que vão ser contra? Trato o Nuzman como um irmão mais novo e é lógico que ele quer (ficar no comitê internacional). Além de ser um poder, ele tem uma facilidade para administrar 2016. Ele é da casa, não é? Se tiver fora, quando for ao COI, terá de pedir isso e aquilo. Se tiver o poder, entra sem problema. Completamente diferente.
Como o senhor vê a Fifa atual e o recente escândalo envolvendo as acusações de venda de votos nas eleições das sedes de 2018 e 2022?
Quem é que fez essa denúncia? Sempre os ingleses. Sabe por quê? Estão fora. Sabe quantos votos eles tiveram? Dois. Então é melhor dizer que você é ladrão e eu sou também. Se ganhasse, o senhor seria uma maravilha, tá bom? É isso, ora. Coisa mais fácil é uma blasfêmia, é maltratar os outros. /COLABOROU VALÉRIA ZUKERAN