terça-feira, 29 de março de 2011

José de Abreu

José de Abreu fala sobre drogas, aborto e política
31 de janeiro de 2011
13h25
ALINE NUNES Jornal da Tarde
José de Abreu gosta de dizer que, para ele, fazer novela das nove ou Malhação não faz diferença. Aos 64 anos e há três décadas atuando em obras da Globo, ele está prestes a estrear em ‘Insensato Coração’. Seu personagem, um homem que já foi famoso e agora vive na sombra do reconhecimento e do conforto que um dia teve, entrará na novela nos próximos capítulos. O personagem é um sujeito bem diferente de Zé – como o ator é chamado pelos amigos, que gosta mesmo é de trabalhar. E não teve vida fácil. Em 1968, aos 21 anos, passou 2 meses preso, vítima da Ditadura Militar. Depois, saiu do Brasil e foi viver em Londres, onde lavou pratos. Sua experiência seguinte foi como motorista de ônibus em Amsterdã. Na Grécia, foi servente de pedreiro. Para ele, o que vale é aproveitar a vida e agregar conhecimento, ainda que sob efeito de ácido. Como contou na entrevista a seguir. Confira:
O estilo do seu personagem (Milton) é bem recorrente nas novelas do Gilberto Braga. Não teve uma má impressão em fazer?
Não. Eu estava fazendo ‘Malhação’ quando o Dennis (Carvalho) estava dirigindo ‘Dalva & Herivelto’ (2010). Daí, encontrei com ele no Projac e fiz um verdadeiro escândalo, disse que tinha adorado a minissérie. Dei um abraço nele e falei: “Vamos fazer a novela do Gilberto (Braga)”. Pedi o papel, mesmo. Era para o Daniel Dantas fazer, mas ele ficou ocupado com o seriado ‘Aline’. Então, me chamaram para o lugar dele.
Quando você foi escalado para ‘Malhação’, se sentiu menosprezado por ser uma novela juvenil? Não. Eu pedi para fazer Malhação. Já tinha feito em 2003, com a Maitê (Proença). Eu adorei trabalhar com a meninada. Não fico preocupado de não ter personagem. A diferença que ganho de salário entre quando estou em casa e quando estou trabalhando é pequena. Mas gosto de sair de casa, ir para o Projac. Não vejo problema em fazer ‘Malhação’ ou novela das nove. Gosto dos jovens.
Mas você já chegou a dizer, no Twitter, que os jovens de hoje são muito hipócritas. Por quê?
Ah, foi numa discussão eleitoral. O Serra levantou na campanha as coisas mais retrógradas. Até essa coisa que o Índio(da Costa, o político do DEM, vice-presidente do José Serra nas eleições de 2010) começou a fazer, de relacionar o PT com maconha… Aí, brinquei que ele era surfista e surfista e maconha têm tudo a ver. Mas enfim… o que falei é que o jovem que usa droga no final de semana tem uma postura na campanha hipócrita, que não é a verdadeira.
Então, você estava defendendo a Dilma Rousseff?
Não é isso. Para mim, os jovens assumiram essa postura no Twitter só para penalizar a Dilma, como a mulher que aprova o aborto e a união entre pessoas do mesmo sexo. A juventude que odeia o PT defende uma postura do Serra que nem ele mesmo tem. A mulher dele fez um aborto, na época em que ele esteve exilado, no Chile. Aliás, até hoje a classe média faz muito aborto, frequenta clínicas de aborto na Tijuca, em Botafogo (bairros do Rio). É muito fácil fazer com cuidado, com preparo. Já a mulher que é pobre, mora no meio do mato, na favela, no interior, não pode fazer aborto. Tem de morrer. Isso é doido.
Você é a favor do aborto e da legalização da maconha?
Eu sou a favor da responsabilidade do cidadão. A mulher precisa chegar no SUS e dizer: “Estou grávida, mas não quero ter o filho”. Tem de ter um prazo, um tempo certo, o seguro. Tem de ser assim. Ela vai lá e faz porque quis fazer. Sobre as drogas… o crack você fuma uma vez e está viciado. Você nunca ouviu falar que a pessoa fumou tanta maconha e bateu o carro ou assaltou alguém na esquina. Convencionou-se socialmente que maconha é uma coisa de favelado. Por mim, a maconha tinha de ser liberada. O álcool provoca mais conflitos sociais. Não tem lei seca para a maconha. A maconha não muda nada na sua vida. No máximo, você vai sair rindo.
Você já usou?
Eu usava maconha, tomava LCD. Era normal. Eu morei em Londres. Lá era liberado. Ninguém dava bola. Mas não uso mais. Foi uma coisa política. O movimento hippie, do qual eu participava, não tinha aquela coisa de ficar sem tomar banho. Era uma coisa mais profunda. A maconha era uma coisa de comunidade, de todo mundo fumar o mesmo baseado.
Você nunca teve uma experiência negativa com ácido?
A gente não tomava ácido para fazer besteira. Tomava para ampliar o conhecimento. Mas a gente se cuidava. Uma vez, li um livro que falava de experiências dos índios da Amazônia, de tribos que tinham essa coisa de ampliar o conhecimento para atingir um outro nível de percepção da vida. Quando a gente fazia uma viagem, a gente se concentrava. E havia pessoas que não tomavam o ácido para poderem cuidar da gente. Era uma dificuldade enorme só pra trocar um disco (risos). Com alguém de fora, não precisávamos nos preocupar com isso.
Como você se manteve no tempo em que viveu em Londres?
Trabalhava das 11h às 15h, lavando pratos. Terminava o serviço, lavava a cozinha, colocava o lixo para fora e estava pronto. Depois, em Amsterdã, fui motorista de um ônibus de turismo alternativo. Depois, fui para uma ilha na Grécia e fui servente de pedreiro. Isso foi muito duro. Minha vida dá um livro. Tanto que estou há dez ano tentando escrever.
Por que você fala que foi tão duro quando viveu na Grécia?
Eu não aguentei muito como servente. O trabalho era muito pesado. Doía o corpo todo. Machucava muito a mão. Eu misturava cimento, cal e água e levava naquele carrinho de pedreiro. Era muito pesado. Eu morava numa Kombi. Comia basicamente arroz integral, feijão azul, muito grão, cereal e pouquíssima carne.
E foi nessa época então que você foi exilado e teve de deixar o Brasil? Aliás, qual foi o motivo?
Sim. Mas eu me auto exilei. Não fui perseguido. Fui preso no Congresso da UNE, em 1968. Fiquei dois meses preso. Sofri muito, mas não fui maltratado. Deus me livre de ser torturado. Eu sonhava todas as noites com isso. Só sabia de casos. Um vizinho tinha a casa invadida às 3 horas da madrugada, estupravam a mulher dele e ainda faziam o coitado confessar que tinha sido ele.
Por esse seu envolvimento político, que político brasileiro você gostaria de ser?
Ah, o Lula. Eu fui aprendendo a gostar dele. O Lula presidente virou uma coisa impressionante. Ele é muito sabido, tem uma grande sensibilidade política.
E quem é a pior figura no nosso cenário político?
O Paulo Maluf. O doutor Paulo, com aquela cara de pau, é imbatível. Ele fala as mesmas coisas há 30 anos. Qualquer jornalista pergunta e ele responde o que quer. Ele criou um personagem e acredita nisso. Um dia, encontrei com ele num evento e ele soltou aquele: “Meu amigo”. Íntimo mesmo, sabe? Mas eu tenho certeza de que ele não fazia menor ideia de quem eu era. Tudo cena.
Você está na Globo há 30 anos. O que faria você deixar a emissora?
Só sairia se fosse para fazer novela na Record. Mas isso não vai acontecer. A Record já me ofereceu uma fortuna, e a Globo cobriu. Gosto de ir lá (na emissora). Conheço todo mundo, do guarda do estacionamento ao cara da iluminação. Gosto de usar a camisa do Flamengo no dia seguinte a uma vitória do time e ver um monte de gente no Projac com a camisa.





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